24 setembro, 2007

Bachelard (1884 – 1962) – Ruptura epistemológica para explicar o novo espírito científico – I

Gaston Bachelard


ARTIGO, 03/09/2007.

“A verdade é filha da discussão,
não da simpatia”.
(Gaston Bachelard)

Uma das principais obras do francês Gaston Bachelard é “O Novo Espírito Científico”, cujo título original é Le Nouvel Esprit Scientifique, escrito em 1934. Não deixemos, no entanto, de citar “A Intuição do Instante” (L’Intuition de l’Instant), escrita um ano mais tarde, também de fundamental importância para entender o pensamento de Bachelard. Sem dúvida, e antes de mais nada, ressaltemos que o filósofo foi responsável por influenciar sobremaneira aquilo que se passou a pensar a ciência e todo um contexto analítico, bem distante das regras apregoadas pelo Positivismo de Auguste Comte, daí – momento em que podemos afirmar ainda – não ter se deixado prender à idéia de uma filosofia ortodoxa, o que lhe concedeu a alcunha de o “filósofo do não”. Isto, em miúdos, significa dizer que Bachelard acreditava que a história do pensamento não era contínua, mas com rupturas, revoluções e cortes epistemológicos. A bem da verdade, Bachelard foi um crítico e defendeu, para a construção da ciência, o racionalismo setorial e aberto, onde havia uma evolução por meio de conflitos. Para ele, o conhecimento necessitava ser aprofundado e aberto para ser considerado ciência.

É inevitável, contudo, que façamos, num primeiro sentido, uma distinção pertinente com o conceito positivista: para este, a certeza era algo concreto e visível, enquanto que Bachelard entendia que não existia nenhuma “certeza”, já que a realidade (certeza) seria construída e interpretada em função da criatividade do espírito de cada sujeito. De acordo com o filósofo, ao abordar o agnosticismo positivista, ou seja, a admissão, por parte desta acepção filosófica, de uma ordem de realidade que não pode ser conhecida, diz: “trata-se de um realismo de segunda posição, de um realismo em reacção contra a realidade habitual, em polémica contra o imediato, de um realismo feito de razão realizada, de razão experimentada (...)” [1]. A experiência científica, portanto, é uma razão confirmada e não proveniente de algo meramente desconhecido. Isto muda completamente o papel do cientista no século XX, já que este deverá depurar suficientemente os fenômenos científicos para se certificar dos seus resultados. Voltando às palavras de Bachelard: “Assim, independente dos acontecimentos que se amontoam e trazem mudanças progressivas dentro do pensamento científico, vamos encontrar uma razão de renovação quase inesgotável para o espírito científico, uma espécie de novidade metafísica essencial (...)” [1]. É interessante observar que o sujeito (cientista) fará uso de uma pensamento vinculado à racionalidade (razão) baseado em alguns pressupostos, levando-se em consideração para este caso o psicólogo, tais como: visão do homem, visão da psicologia, conceitos da teoria do novo espírito científico, dinâmica psíquica e um método de trabalho. Com a razão teríamos a constituição de (novas) idéias sobre o mundo – a formação dos a prioris e a posteriores.

Outra questão que deve ser aprofundada é no que diz respeito à história, à idéia e ao pensamento. Para Bachelard, conforme citado, a razão formava-se por meio de uma construção de idéias, por exemplo, com aspecto de descontinuidade, havendo vários cortes epistemólogicos, considerados como negações, mas não confundidos com o “falsificacionismo”. Para essa construção, no entendimento do filósofo, havia alguns importante obstáculos, como o senso comum, a massificação de uma teoria e o pensamento igualitário. Era justo contra isto que lutava Bachelard: com as rupturas epistemológicas e o uso da razão poder-se-ia criticar e criar uma nova ciência, pois pensava que esta se desenvolvia em meio ao conflito. Daí, ser Bachelard conhecido como “filósofo do não”, mas explica, antes de um entendimento errôneo da questão: “Uma observação é, de resto, útil para previnir um equívoco: não há nada de automático nestas negações e não deverá esperar-se encontrar uma espécie de conversão simples que possa fazer com que as novas doutrinas entrem logicamente no quadro das antigas. Trata-se de facto de uma verdadeira extensão (...)” [1]. Enfim, a idéia do “novo pensamento científico” é a de que, através de pressupostos epistemológicos (negações, cortes, fragmentos, instantes), os produtos científicos devem não apenas ser simples descobertas, mas resultados de uma cuidadosa criação.

[1]. BACHELARD, Gaston. O Novo Espírito Científico. Lisboa: Edições 70, 1996.
Mendes Júnior.

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